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Porque gostamos tanto de Comédia Romântica (e outras ficções)?

Dois personagens completamente diferentes, sendo um desajeitado e outro apaixonante, se esbarram acidentalmente e,  por ironia do destino ou consequência de uma aposta, se apaixonam perdidamente. E no momento em que os olhares se cruzam e os lábios se aproximam, um barulho os afasta e é aí que as coisas começam a dar errado! Um mal entendido põe fim à relação. A tristeza é absoluta, ambos decidem seguir em frente. Mas, no último minuto, antes que o avião levante vôo ou que o padre oficialize um casamento sem amor, lá está um dos personagens arrependido pedindo uma segunda chance. O casal então se abraça, se beija e vivem, a partir daquele momento, felizes para sempre.

A gente sabe que é falso, a gente sabe que na vida real as coisas são muito diferentes, a gente sabe que "príncipes encantados" ou "vampiros apaixonados que brilham no sol" não existem, mas mesmo assim, a gente AMA, a gente suspira, a gente sorri, a gente chora, a gente se arrepia, a gente comemora, a gente se apaixona e a gente se perde completamente em um romance. Mas... se é algo tão fora da realidade, porque a gente gosta tanto?

Na década de 90, os cientistas descobriram que nós temos "um grupo" de neurônios que é capaz de reproduzir sentimentos e ações através da observação e da imitação, os chamados neurônios-espelho.

Para os cientistas, estes neurônios foram essenciais para nossa evolução, pois propiciaram o aprendizado de habilidades, e foram determinantes para nossa sobrevivência, pois eles permitiram a leitura das intenções e emoções alheias - criando com isso empatia entre os membros do grupo e antecipando comportamentos hostis dos seres a sua volta.

Trazendo o conceito para a nossa realidade: 
Sabe quando a gente assiste repetidamente a uma coreografia e, mesmo sem nunca tê-la executado, conseguimos reproduzir os passos como se houvéssemos ensaiado antes? É por conta dos neurônios-espelho. 

Outro exemplo: 
Sabe aquela sensação de dor que nós temos quando um jogador de futebol leva uma bolada no meio das pernas ou quando alguém dá uma topada com o dedinho do pé em uma quina? Mesmo não sendo homens ou nunca termos batido o dedinho do pé em uma quina a gente sente a dor como se fosse a nossa... As vezes até nos falta ar! São os neurônios-espelho agindo. Por se "colocar no lugar do outro" também chamados de Neurônios da Empatia ou Neurônios de Gandhi.

Mas o que os Neurônios-Espelho tem a ver com os Romances?

Pois bem, segundo Pedro de Camargo, autor do livro "Eu compro sim! Mas a culpa é dos hormônios."; estudos seguintes relacionaram neurônios-espelhos com obras de ficção (livros, TV, Filmes) e constataram que o cérebro humano é capaz de realizar uma projeção imaginária de um estado subjetivo, afetivo ou cognitivo. 

Deste modo, quando uma pessoa mergulha em uma história de ficção as células se "acendem" e respondem como se ela estivesse fazendo o que o personagem está fazendo. É como eu falei na postagem do filme "Como perder um homem em dez dias", somos capazes de sentir prazer, medo, dor, agonia, felicidade, tristeza.

Voltando ao autor, Pedro de Camargo diz que o nosso cérebro é um sistema físico movido por impulsos elétricos e químicos e a nossa mente, que os nossos comportamentos são produtos desses processos e que a nossa consciência é somente uma pequena parte de tudo isso. Por conta disso, para o cérebro é muito difícil distinguir o real do imaginário,  logo, personagens fictícios podem nos trazer sensações reais. 

Confesse! Você já sentiu aquele vazio existencial quando uma novela ou série acabou!!! 
Isso acontece porque depois de "conviver" bastante tempo com os personagens, eles se tornam parte de nossas vidas e nós realmente sentimos saudades. Bizarro e sensacional, não?


E porque nós gostamos tanto de Comédia Romântica (e outras ficções)?

Segundo o autor Pedro de Camargo, nós gostamos de qualquer gênero de ficção "por ser uma forma de escape em meios a tempos difíceis, pois ao entrar no personagem, nos esquecemos, por um tempo, da nossa realidade." 

Creio que cada pessoa se identifica com um gênero de ficção conforme a emoção que está latente no momento. Qual emoção você deseja ou precisa sentir? Uns querem se sentir heróis, outros querem se sentir amados, outros precisam vivenciar aquela adrenalina de perseguição, outros precisam extravasar inconscientemente suas emoções de tristeza, de raiva, de ansiedade. 

Falando em comédia romântica, acredito que as pessoas gostam desse gênero por que elas nos fazem reviver a parte mais deliciosa de um relacionamento que é aquele momento inicial, o momento da conquista. Aquele momento em que você ainda tem dúvidas sobre o que sente e o que a pessoa sente, que você curte cada detalhe, que você se permite ser conquistado e que você se entrega - tendo a certeza que é uma entrega segura e que aquele sentimento não vai te machucar.

Além disso as comédias românticas te fazem reviver os amores platônicos que passaram pela sua vida como aquela pessoa popular que jamais olhou para você, aquele artista famoso que sempre esteve em seus sonhos mas que você nunca teve a chance de conhecer, aquela pessoa que nos dizia que só queria nossa amizade ou ainda, aquela pessoa que não sabíamos de certo se amávamos ou odiávamos porque vivia nos atormentando.

As comédias românticas costumam trazer temas que te propiciam reviver momentos felizes ou momentos em que você queria que tudo tivesse sido diferente: sua escola, sua faculdade, seu emprego... E ainda costumam resgatar os sentimentos da sua infância como reviver as comemorações de Natal, as férias em família ou ainda, os contos de fadas que ouvíamos.

Além de tudo, a comédia romântica nos traz leveza, simplicidade, alegria e o tão esperado FINAL FELIZ. Mesmo sabendo que tudo não passa de ficção ainda sim é gostoso sentir que tudo vai ficar bem.


E para finalizar...
Se o cérebro não distingue a realidade da ficção, como é que a gente sabe a diferença?

O neurocientista indiano Vilayanur Ramachandran, especialista em neurônios-espelho explica, em sua palestra "Os neurônios que moldaram a civilização", que ao mesmo tempo em que nós temos os neurônios-espelho simulando sensações em nossa mente, temos em nossa pele, neurônios que são receptores pelo toque e pela dor que enviam a importante mensagem de que "tudo bem, você não está sendo tocado. Isto não está acontecendo de verdade.". O Neurocientista conclui dizendo a nossa pele literalmente é a barreira faz a diferenciação entre nós e o outros seres humanos.

Duplamente sensacional não?

“Nós compreendemos o outro porque temos dentro de nós a mesma experiência”

      Merleau Ponty - Retirado de 


Quem diria que, depois de velha, haveria um assunto em biologia que eu iria me interessar tanto?
Se você quiser saber mais sobre eles sobre os neurônios-espelho seguem as fontes que me "espelhei" para escrever essa postagem. Até mais, =)

Livros: 

  1. Eu compro, sim! Mas a culpa é dos hormônios... (2013) - Pedro de Camargo - @professorpedrocamargo

Vídeo: 


Demais fontes (não citei os conteúdos abaixo, mas os usei como pesquisa): 

  1. Comportamento do Consumidor - A Biologia, anatomia e fisiologia de Consumo.(2010)
    Autor: Pedro de Camargo @professorpedrocamargo
  2. O que são Neurônios-Espelho? Revista Fapesp
  3. Neurônios Espelho e a Empatia - Jornal da PUC
  4. Neurônios Espelho - Scielo 
  5. Como funciona os Neurônios Espelhos? Site Vitallogy
  6. Neurônios Espelho atuam na vida das pessoas de diferentes formas - Jornal da USP
  7. A Mente Comanda e Molda o cérebro - O Segredo.

Comentários

Ana disse…
Muito interessante! Eu acho até que é por isso que os livros são mais intensos, porque no caso, usamos nossa imaginação mesmo com as descrições no texto, e você já tem o seu próprio conceito do que é bonito, apaixonante e enfim, acho que ler coloca você mais ainda naquele mundo, pelo menos pra mim.
Juju Amaral disse…
Uhummm... e a gente tem AQUELA decepção quando vira filme né?
Foi assim com Sirius Black, de Harry Potter 😔.

Eu comecei a ler os livros depois do segundo filme, então os atores principais eu não tive o choque... agora, os dementadores e o Sirius! Jesus! Quanta decepção.